O mar é belo, sempre o ouvi dizer por estas bandas.
E, hoje está particularmente belo. É simplesmente magnífico o espectáculo que aqui observo, frente à Praia do Burrinho, (areia nem vestígios, está maré-cheia), a reflexão dos raios solares sobre a superfície da água.
Há que curtir esta vista, porque o sol pira-se num ápice.
É neste pendor contemplativo com os olhos postos no oceano, que me deixo transportar nas minhas passagens e memórias de vida, que me conduzem a um misto de alegria e tristeza.
Alegria, porque ontem, reencontrei no FB, uma Prima, que apenas vi uma vez na minha vida. Soube da sua existência, por um acaso, em Agosto do ano de 1997, num fim-de-semana passado em Penamacor, no regresso de uma viagem que fiz a Cabo Verde, ás ilhas do Sal, Santiago e S. Vicente.
Com os poucos dados de que dispunha, os meios disponíveis para pesquisa também não abundavam como nos dias que correm, consegui, contudo, em pouco tempo descobri-la.
Um telefonema, apresentações feitas, e combinei uma visita para conhecê-la no seu local de residência. Isso aconteceu em Setembro de 1997, no dia 20.
Havia já algum tempo que tinha feito a reserva de alojamento no Hotel Estoril Sol, entretanto demolido, para o fim-de-semana de 19 a 21 de Setembro de 1977.
Recorda-me de ter chegado ao hotel por volta das 18 horas de sexta-feira, feito o check-in, foi-me atribuído o quarto 617, um banhinho, e esperei por uns companheiros no bar panorâmico que existia no 8 andar, se não me trai a memória, com uma deslumbrante vista sobre o Tejo e o mar.
Um copinho de aconchego e boas vindas, chegaram os meus amigos e fomos jantar nessa noite a um restaurante de nome “João Padeiro”, em Cascais.
Acabámos a noite no “Rasputine”, um conhecido bar no Estoril.
Sábado, passei a manhã a assistir a um show-room, com almoço incluído. Após o almoço, desloquei-me a casa da Prima que nunca tinha visto. Conheci então, a minha Prima, e toda a sua família. Do meu Tio, tenho a vaga ideia de um dia o ter visto em Penamacor, num funeral de um familiar.
Como o tempo não era muito, pouco conversámos. Tinha nesse dia marcado o jantar no salão Preto Prata do Casino Estoril. Estava em cena um espectáculo com a Rita Guerra e o Júlio César.
Acabado o jantar, tempo para derreter umas moedinhas nas slot-machines.
Bafejou-me a sorte nessa noite, ganhei uns 40 contos. Com mais dois amigos, fui então até um outro meu conhecido bar na zona, ali para os lados da Parede, o "Iate Ben", onde estoirei parte do dinheiro ganho no casino, a beber uns “ Swing”.
Domingo, dormi até poder, levantei-me e fui fazer um passeio pela Serra de Sintra e Sintra, onde algures comi algo para enganar o estômago. Tinha para esse dia combinado o jantar com o meu grande Amigo "O Nalgas".
Jantei com ele, a mulher e a filha, no “Farta Pão”, restaurante com um ambiente campestre, na Malveira da Serra.
Nesse fim-de-semana, pela segunda vez, depois do jantar, fui novamente até ao “Rasputine” dar uma voltinha e beber o copinho da sossega. Tinha que estar em Sines ás oito horas de segunda-feira.
Quis o destino que nessa noite, já de regresso a Sines, fosse abalroado na traseira do meu carro, parado num semáforo, na Cruz Quebrada, no cruzamento de acesso ao Estádio Nacional. Na outra viatura, ao volante, um fulano com uns canecos bem bebidos e umas brocas bem fumadas, apenas me dizia:
- Desculpe, desculpe, não o vi, não o vi.
Como também já estava com alguma aceleração, apenas lhe pedi para assinar uma declaração amigável, que logo se prontificou, problema foi escrever, os dedos tremiam em demasia. Lá conseguiu assinar, e cheguei a Sines a horas de ir trabalhar.
Tempos em que a resistência física era outra.
Mas, não é esta já constatada diminuição de resistência física, que me leva e este, também, estado de tristeza. Não, não é.
Ao lembrar-me das minhas idas de outrora ao “Rasputine”, obrigatoriamente vêm-me ao pensamento a imagem do meu Grande Amigo Zé De Vasconcelos, a quem em Maio do ano passado, tive a ousadia de dedicar umas palavras nestes modestos trechos do Zé Morgas.
Estive há dias no Seu jantar de despedida da empresa, no passado dia três do corrente mês, no restaurante "Altinho do Lobo", nas Relvas Verdes. Nunca vi jantar com tanta gente, e outro houve passados dias.
Merecias mais, Amigo, todos o sabemos.
Ainda tenho presentes as palavras que nos ofereceste, e o que ainda te martiriza pensar, que alguns colegas te pudessem ter detestado, ou ainda detestar, pela tua rigidez. Ainda tive a sensação que deixarias cair alguma lágrima. Deus sabe o esforço que fizeste mas nunca deixaste cair nenhuma.
Zé De Vasconcelos, prefiro apenas recordar aqueles que foram pródigos nos louvores à inteireza do teu carácter, pessoalmente compreendo essa tua rigidez, apenas pelo teu inesgotável desejo de saber mais, e a vontade de ensinar da forma como tu tão bem sabes fazê-lo.
Não conheço ninguém tão intrinsecamente honesto, nem que acredite tanto nas pessoas.
As conversas contigo são um prazer, intermináveis, tal como as histórias, e é uma história que “vivemos” os dois, que tu tanto contas, que aqui vou partilhar.
Foi na década de noventa do século passado. Tinha vindo de Cuba havia pouco tempo. Numa das minhas muitas idas ao “Rasputine”, conheci uma mulher bonita, muito sensual. Conversei algum tempo com ela, bebemos uns “Swing”, o whisky da minha eleição, fumei um puro havano, e disse-lhe que tinha que me deslocar a Sines, pois aqui trabalhava, aqui tinha a minha empresa. Dei-lhe o meu número de telefone, deu-me o dela e despedi-me.
Uns dias depois telefonei-lhe a convidá-la para jantar, num sábado. Nesse dia decidi-me pelo restaurante “A Ginginha Transmontana”, em Cascais. É um local muito agradável, à luz da vela, com uma decoração em ferro velho muito original, e onde os pratos são confeccionados na telha, telha mourisca. È uma delícia tanto o peixe como a carne. Com a pontualidade que me é característica, à hora combinada estava no local acordado, e fomos para o restaurante. Durante o jantar as confidências e inconfidências, sucederam-se, e no final fomos novamente ao “Rasputine”. Dois ou três whiskies depois, outras tantas danças, estava a convidá-la a vir a Sines visitar a minha empresa: A Petroquímica de Sines, a empresa do Sr. Engenheiro Pena, pois tempos houve, em que na vida da noite, assim era conhecido. Assinava os cartões de identificação das garrafas com esse pseudónimo. Bem o sabes, Amigo.
Reparei nalguma hesitação, insisti, mas, um bom jantar num bom restaurante, de outros que frequentava lhe falei, bom vinho, bom whisky, havanos puros, engravatado, … foram argumentos mais que suficientes para o sucesso do convite.
Veio comigo para Sines. Muitas foram as vezes durante a viagem que silenciosamente me interroguei: Como me vou safar?
Foi então que me lembrou de consultar o meu horário de bolso e saber quem a essa hora estava de turno.
É o turno do Vasconcelos, Estou safo, pensei logo.
Dou comigo à portaria e a falar pelo telefone interno com o meu Grande Amigo Zé De Vasconcelos.
- Vasco, estou entalado, tenho aqui comigo alguém a quem disse que era o dono disto.
- Já aí vou, espera um pouco.
Fui para o carro, e lá lhe disse, que por uma questão de formalidades de segurança, e não ser permitida a entrada de visitas na unidade, durante o período da noite, esperaria ali na portaria pelos meus colaboradores.
Para minha surpresa, apareceu o Zé De Vasconcelos, mas acompanhado com mais duas ou três pessoas, que se fizeram passar pelos respectivos chefes das unidades fabris do complexo.
- Sr. Engº Pena, boa noite, como está?
- Bem, obrigado, e vocês?
Em pouco tempo relatou a pseudo!? situação da fábrica. Fantástico.
Zé De Vasconcelos, só um Grande Homem como tu, inteligente, com sentido de humor inabalável, comunicador nato e exímio improvisador, poderia ter feito "aquele jeito".
Impressionaste a minha conhecida de tal forma, que pouco mais precisei de falar. Ainda hoje terá sérias dúvidas se serei de facto o dono da petroquímica de Sines
Foi deixar rolar… curtir até o sol raiar.
Saudades.
Cenas da vida.
Desta vida que ainda merece ser vivida.
Zé Morgas